O Grau de Aprendiz na Maçonaria: História, Simbolismo e Ensinamentos (2/3)

Aprendiz

Uma visão iniciática do Grau de Aprendiz leva-nos a uma indagação primeira: além da Iniciação o que existe de iniciático no Grau de Aprendiz? Tentaremos trazer alguma luz a esse respeito.

Em primeiro lugar, a Iniciação é um Rito de Passagem, isto é, um Rito que permite a transmutação de um estado a outro. No caso maçónico, sai-se da condição do profano para a de Iniciado, ou das trevas à Luz, a Luz da Iniciação, aquela Luz que se nos abre os sentidos não corpóreos – via liturgia – para as verdades veladas dos Símbolos e do esoterismo maçónico.

Esta Iniciação litúrgica não acontece apenas uma vez. Acontece várias vezes. No simbolismo maçónico, são três as Iniciações, uma para cada Grau simbólico.

Mas, além da Iniciação propriamente dita com todo o seu ritualismo e a sua liturgia, a Maçonaria tem aspectos iniciáticos nas suas Sessões Económicas, que são a abertura e o encerramento dos trabalhos da Loja Maçónica.

Ali, tanto o Apr∴, quanto todos os presentes, independentemente do seu Grau e qualidade, participam do acto litúrgico iniciático que é a abertura e encerramento dos trabalhos de uma Loja Maçónica.

Um livro necessário para entendermos melhor este aspecto iniciático do Apr∴ é o Comentários ao Ritual de Aprendiz, Vademecum Iniciático, do Irm∴ Nicola Aslan. Ali, nos comentários iniciáticos ele traz-nos alguns assuntos imprescindíveis para a nossa educação iniciática.

Diz-nos o Irm∴ Aslan quando fala da “Interpretação Esotérica da Iniciação Maçónica” aborda dentre outros aspectos: a influência do ocultismo no esoterismo maçónico, a doutrina interior ou secreta, o ensino iniciático, o recrutamento dos candidatos, a prova da terra, a câmara das reflexões, os três princípios herméticos, o testamento, os deveres para com Deus, além da preparação do candidato, quando fala dos metais, das vestes, da corda, da venda, do facto de ser declarado o aspirante livre e de bons costumes, a porta do Templo e a porta estreita e baixa, (comum a todas as Iniciações).

O Templo Maçónico ele o aborda dentre os seguintes factores: a Espada sobre o peito, o exame filosófico do candidato, a taça sagrada, o banco das reflexões, as provas do ar, água, fogo, a beneficência e a solidariedade, o Altar dos Juramentos, o juramento, a Luz Maçónica, as Espadas, a consagração do Neófito, a Espada Flamígera, o Avental, as Luvas, a proclamação do Neófito, o ângulo nordeste e a restituição dos metais.

Tudo isso dentro da interpretação esotérica da Iniciação Maçónica, que a nosso ver, é a primeira parte da educação iniciática do Aprendiz.

Uma visão simbólica do Grau de Aprendiz

Antes de passarmos para uma tentativa de visão simbólica do Grau de Aprendiz, é necessário que recordemos o conceito de símbolo. Para tanto, vamos buscar uma conceituação de um autor não Maçom, por considerá-la uma das mais completas.

“São símbolos os objectos, actos, conceitos ou formas de linguagem que acumulam ambiguamente vários significados diferentes e que, simultaneamente, evocam emoções e sentimentos, impelindo os homens à acção”. Irm∴ Abner Cohen, O Homem Bidimensional, Zahar Editores, Rio, pág. 5.

O Irm∴ Cohen dá-nos a amplitude do símbolo que não é apenas uma representação pictórica, um desenho, os próprios objectos podem ser símbolo (como o Malhete, por exemplo), actos também o são (o circular no Templo é um acto simbólico, o ficar à ordem, também), conceitos maçónicos podem também ser um símbolo, desde que evoquem emoções e sentimentos, tenham significados diferentes e simultâneos, bem como a forma de linguagem maçónica pode ser simbólica, como por exemplo, “sábio Irm∴ e M∴”.

Convém insistir mais um pouco na compreensão desta conceituação de símbolo do Irm∴ Cohen, porque ele nos diz que os objectos, actos, conceitos, formas de linguagem acumulam ambiguamente vários significados diferentes. Isso quer dizer que não há uma definição de símbolo que seja única e definitiva. O símbolo pressupõe vários significados diferentes, para várias pessoas, em determinado tempo. Por isso a nossa Ordem é universalista, tanto ao abrigar os vários Símbolos que compõem o seu sistema, quanto ao possibilitar a verbalização dos seus Símbolos.

Um Cinzel tem o significado próprio da arte de pedreiro, um sentido que lhe é peculiar, mas tem os vários significados que a Maçonaria proporciona àquele que o vive no dia-a-dia da Ordem e àquele que procura a sua exegese.

O Irm∴ Cohen diz-nos mais que os Símbolos evocam emoções e sentimentos, impelindo os homens à acção. Que sentimentos provocam no Maçom o Compasso e o Esquadro e a Legra G, Símbolo máximo da Ordem? E nas outras pessoas? Que acções provocam esse Símbolo no agir do Maçom no seu dia-a-dia? É possível dizê-lo?

Esta digressão está sendo feita porque o mundo em que vivemos é um mundo de símbolos diferentes e de diferentes símbolos. Todos muito fugazes como a própria contemporaneidade. Muitos sequer admitem que os símbolos ainda fazem parte do “homem de plástico” que se prepara para atravessar os oceanos do universo rumo a Marte e outros planetas. Por enquanto.

Mas, voltemos ao nosso assunto principal que é o de tentar descobrir o que tem o Grau de Aprendiz de Simbólico e como o Apr∴ pode e deve tomar conhecimento e interiorizar estas verdades simbólicas, que não são traduzíveis na fria letra da forma escrita, mas apenas vivenciado.

O Apr∴ poderia começar recordando a sua Iniciação, toda ela plena de Símbolos, como por exemplo as provas de purificação por que passou: a terra, o ar, água e o fogo, os Símbolos da Câmara das Reflexões, dentre outros.

O próprio Apr∴ é um Símbolo e quase tudo que o rodeia, senão vejamos: a sua Idade Iniciática, a sua marcha ao adentrar o Templo; o silêncio iniciático que concordou em manter e que é diferente do silêncio profano porque é um silêncio que cria e transforma, dentre outros.

A Sessão de Apr∴ tem muitos Símbolos à sua volta, a começar pelo próprio Templo Maçónico e pela Loja Maçónica em funcionamento, considerada um microcosmo, isto é, um mundo pequeno e que está inserido num mundo maior, o macrocosmo.

Ao olhar o tecto do Templo vai encontrar uma abóbada que reproduz o céu do zodíaco com profunda significação simbólica. O deambular das Luzes e dos Oficiais e os seus objectos litúrgicos na Sessão Maçónica, também estão plenos de Símbolos.

Ele próprio, o Aprendiz como a Pedra Bruta que se desbasta para poder aspirar ao segundo Grau, o Grau de Comp∴, é um Símbolo. Como atender, senão pela linguagem dos Símbolos, que a Pedra Bruta é o próprio recém-Iniciado e que durante a sua Iniciação fizeram com que começasse o seu desbaste batendo com um Malho numa pedra bruta colocada no Templo? E no final, fica sabendo que não irá construir Templos materiais, e sim o Templo interior representado por ele mesmo?

Tudo à sua volta, no Templo, é pleno de Símbolo. E não apenas Símbolo, mas também esoterismo, ocultismo, ritualismo, liturgia, dentre outros aspectos.

Além do mais, todos estes Símbolos estão ali para realizar a sua educação simbólica, quer se aperceba disso conscientemente ou não. E mais, esta educação simbólica é feita sob o prisma do universalismo e do eclectismo. Dentro do espírito maçónico, o Maçom sente e vê o Símbolo como um cidadão do mundo, sem deixar de ser, também, um cidadão do seu País, do seu Estado, da sua Cidade, da sua Comunidade e da sua Família. E, sobretudo, um cidadão que tem o valor absoluto do indivíduo enquanto pessoa humana.

E dentro desta perspectiva que a visão simbólica do Grau de Apr∴ deverá ser apercebida pelo novel membro da Ordem. Os MM∴ devem estar preparados – simbolicamente – para transmitir os Símbolos dos quais são parte e por seu intermédio fazem com que se manifestem, para que o Apr∴ possa ter acesso ao mundo simbólico da Maçonaria.

Uma visão esotérica do Grau de Aprendiz

A Maçonaria substantiva é esotérica por excelência. Denominamos de Maçonaria substantiva aquela Maçonaria que difere da outras organizações, por seus conhecimentos interiores, pela sua vida interna. É quando está em funcionamento a Loja Esotérica, a Loja Ritual, que a Maçonaria Substantiva existe.

Antes de tecermos alguns comentários acerca da visão esotérica do Grau de Apr∴ é necessário que tenhamos um conceito do que seja esoterismo.

A Irm∴ Lubicz no seu livro Esoterismo Y Simbolismo diz-nos que “El esoterismo no puede ser escrito ni dicho, ni, en consecuencia, ser traicionado. Hay que estar preparado para captarlo, verlo, escucharlo a su elección. Esta preparación no és um Saber sino un Poder y sólo puedo adquirirse mediante el esfuerzo de la persona, una lucha contra sus obstáculos e una victoria sobre su naturaleza animal humana.” (pág. 8)

O Irm∴ Aslan diz-nos que

“… o esotérico…confere-lhe (à Maçonaria) o seu aspecto de associação moral e espiritual, única razão de ser da Instituição Maçónica… O simbolismo e o esoterismo maçónico acham-se concentrados, em grande parte, na Iniciação e na Loja de Aprendiz…” (Comentários ao Ritual de Apr∴, pág. 30-1).

Portanto, é necessária uma predisposição do Iniciado em perceber, em vivenciar o esoterismo. Não existem exercícios teóricos que possam fazer com que o homem dele se aperceba. E esta predisposição é um estado de espírito, é uma sensibilidade que nos permitirá chegar à Iniciação Real.

No nosso entender, a vivência constante do Ritual Maçónico, em todas as Sessões é uma das condições indispensáveis para que possamos penetrar no mundo do esoterismo maçónico. Os livros muito pouco podem ajudar nessa tarefa. É vivência. Muita vivência.

A Loja Esotérica conceituamos a Loja em funcionamento litúrgico. O esoterista Irm∴ Oswaldo Wirth citado pelo Irm∴ Aslan, ao comentar a sabedoria do Ven∴ M∴ diz que ela “consiste em dirigir o trabalho construtivo e o seu papel é intelectual, tornando-se o intérprete da Sabedoria da Arte Maçónica e não da sua própria. É portanto uma Sabedoria especializada, modesta e realmente sábia na sua ambição limitada.” E esta sabedoria tem exercício na Loja Esotérica.

O Ven∴ não é apenas o dirigente da Loja, posto que o governo da Loja Maçónica é exercido pelo Ven∴ e pelos dois VVig∴. Ele desempenha o papel de Iniciador na Sessão de Iniciação com a Sabedoria dos Iniciados, o papel litúrgico de consagrador do novo membro da Ordem, o papel de fonte de Luz para toda a Loja quando está no Oriente em função litúrgica, já que estamos falando da Luz da Iniciação, da Luz esotérica. É o administrador litúrgico quando dirige os trabalhos e é o administrador no sentido profano quando administra a parte profana da Loja Maçónica.

Somente o esoterismo maçónico vai permitir que nos apercebamos da importância do Ritual Maçónico ser seguido conforme as fórmulas litúrgicas e em todo o seu teor, sem as costumeiras supressões sob a alegação do adiantado da hora.

O Esoterismo Maçónico, como o seu simbolismo e a sua liturgia, deve ser vivenciado em cada Sessão Maçónica ritualística. Daí a necessidade que temos de participar de todas elas, porque nos estamos educando esotericamente. E essa educação é muito diferente da educação profana que recebemos. Nela, o M∴ é o próprio Iniciado.

Uma visão educativa do Grau de Aprendiz

A Maçonaria autoproclama-se uma escola educativa. Mas, o que vem a ser educação em Maçonaria? Como esta educação é feita numa sociedade iniciática por excelência? Uma sociedade que apesar de iniciática, o é também progressista sem que isso signifique perder os ensinamentos do passado e a convivência com a tradição?

A nosso ver a educação em Maçonaria poderá estar assim constituída: a educação iniciática, educação litúrgico-ritualística, educação universalista e ecléctica, educação individual, educação simbólica, educação familiar, dentre outras variantes.

educação iniciática, por exemplo, faz com que o Aprendiz tenha o seu momento de silêncio, silêncio iniciático, onde a aprendizagem é interior e onde aprende a dominar o seu desejo de exteriorizar a sua opinião, ouvindo a dos outros pares, o seus Ilrm∴ Maçons.

A educação iniciática começada na Iniciação litúrgica faz com que aprendamos como os antigos Iniciados, através de provas simbólicas que transmutam o homem que a elas se submeteu.

A educação litúrgica cm Maçonaria tem uma amplitude muito grande, principalmente quando o Ritual é praticado na sua inteireza. Quando todos os participantes, individual ou colectivamente, estão conscientes do papel litúrgico-iniciático que devem desempenhar na Sessão Maçónica.

Esta educação litúrgica, por exemplo, faz com que a sua veste, a veste do Maçom, o Avental, seja um elo de igualdade entre todos daquele grau, o que faz com que conviva com a prática da igualdade, simbolicamente representada pelo Pavimento Mosaico. Não importa a sua condição profana ou maçónica, o Avental nivela ritualística e liturgicamente o Maçom no Templo Maçónico.

A educação litúrgica recebida no interior do Templo, tem reflexos – visíveis ou não – no seu pensamento e no seu agir – dentro e fora da Loja.

Esta educação litúrgica, permite que o Maçom possa expressar a sua opinião com toda a veracidade de que é capaz, independentemente de quem esteja presente à Sessão. Esta igualdade real dentro da Loja traz benefícios para as suas acções fora e dentro da Ordem.

Para não nos alongarmos muito, a educação litúrgica maçónica permite, por exemplo, que se ocupe qualquer cargo litúrgico, desde que esteja in ciaticamente apto. A sua condição de Iniciado permite ocupar qualquer cargo litúrgico-simbólico da Sessão, e o torna membro nato da assembleia maçónica ali reunida. Assembleia essa que é capaz, inclusive, de decidir os destinos da Loja, como nas Sessões Eleitorais.

educação universalista da Ordem, transforma o Maçom não apenas em membro de uma Oficina, de uma Loja Maçónica, mas integrante de toda a Maçonaria, enquanto Iniciado. Em qualquer lugar será possível participar do Ritual Maçónico, desde que esteja funcionando no Grau iniciático do Maçom. É a linguagem iniciática e dos Símbolos, que nivela e iguala todo Maçom, independentemente do lugar onde se encontra e do Rito que pratique.

Além do mais esta educação universalista faz com que conviva com a divisa da Ordem: Liberdade, Igualdade e Fraternidade, dentro do prisma de que a trilogia deverá ser vista e vivenciada como a liberdade que iguala, a igualdade que liberta e a fraternidade que iguala e liberta (conforme Eikopoema do Irm∴ Carvalho Neves, de 1991).

Educação ecléctica que permite o Maçom conviver – como sempre conviveu, desde o surgimento da Maçonaria Especulativa, em 1717 – com todas as religiões, todos os credos. Tem o GADU como síntese do Deus de cada um. E tem na prática real da democracia, a possibilidade de conviver com indivíduos pertencentes aos mais variados credos políticos, desde que estes permitam.

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